quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Democratização da comunicação: É possível?

O questionamento central é se existe uma participação real da sociedade civil nesse processo de democratização da comunicação. E como podemos fazer para que se crie um modelo de comunicação em que os interesses públicos se sobreponham aos interesses mercadológicos e privados desse atual modelo em que uma pequena quantidade de grandes empresas concentra quase todos os meios de comunicação.
Essa concentração (monopolização) do setor de comunicação nas mãos de poucas famílias traz conseqüências em relação à programação e ao conteúdo. Há uma menor variedade de programas e, muitas vezes, os programas exibidos são de interesse dos proprietários, e não dos cidadãos e telespectadores. A publicidade passa a ter um peso maior e existe uma manipulação de acordo com os interesses mercadológicos e políticos dos donos dos meios. Por exemplo, um jornal com uma linha política igual à do governo vigente, vai dar ênfase às notícias que interessam ao governo, que falam bem do governante. Provavelmente, vai falar menos da oposição, ou até falar mais coisas ruins do que coisas boas. Segundo o pesquisador Mc Chesney, o mercado global de mídia é controlado por cerca de 10 grandes conglomerados e outras 40 empresas, que, por coincidência ou não, são ligadas a esses 10 conglomerados. Uma explicação utilizada para explicar essa oligopolização é o processo biológico de sinergia: a fusão de diferentes políticas públicas numa só política de comunicações e a presença de conglomerados empresariais (os global players) e organismos internacionais como a OMC como poderosos atores na formulação dessa política de comunicações. (LIMA, 2004)
De acordo com Carlos Gilberto Roldão, devemos levar em consideração que estamos inseridos em um Estado liberal desde o século XX, e que é necessário entender seu funcionamento para podermos pensar em saídas viáveis. Também é preciso entender sua função e utilização em todo o processo histórico, além de estudar o processo histórico da sociedade civil nele inserida. Nesse Estado liberal, os interesses dos proprietários dos meios de comunicação normalmente prevalecem, pois os valores dominantes de uma sociedade também são liberais. Isso acontece porque o liberalismo diz que o intervencionismo estatal dificulta o desenvolvimento econômico. O Brasil começa a contar com várias novas regras na área da comunicação a partir de 1995. Essas regras em vigor tornam possível a desregulamentação e a privatização das comunicações, além de permitir uma participação direta do capital estrangeiro. No mesmo ano (1995), Nuzzi indica por uma pesquisa que 90% da mídia brasileira é controlada por 13 grupos familiares. Só a família Marinho (da rede Globo) tem participação societária em 32 emissoras de televisão, sendo 10 só dela. Há também um levantamento indicando que 31,12% das emissoras de TV e rádio eram controladas por políticos. (LIMA, 2004)
Por ser um Estado neoliberal, existe no Brasil uma tendência de se colocar ao lado dos concessionários da mídia. O Estado se aproveita dessa união para garantir sua hegemonia, seus interesses e seu lucro. Um bom exemplo foi a do acordo feito entre os governantes militares e a Rede Globo na época da ditadura militar. O Jornal Nacional (JN) da rede Globo passa a ser o primeiro jornal em rede nacional graças à estrutura de satélite financiada pelos militares. Em troca, o JN passa a noticiar matérias de interesse dos militares, e procura dar uma visão de bom governo para esse período tão controverso.
Existe, na sociedade civil, um processo em que uma classe dominante exerce uma influência em uma classe dominada. A classe dominante procura usar sua liderança política, intelectual e moral para impor seus interesses e suas vontades.
Roldão (2008) também nos convida a entender como os valores culturais são reproduzidos pelo capitalismo. O receptor, nos dias de hoje, possui uma grande variedade de meios de comunicação (televisão, rádio, meios impressos, internet, etc) e uma maior facilidade para acessá-los. Mas essa maior facilidade não quer dizer que o receptor se utiliza melhor desses meios. Muitas vezes, há um turbilhão de informações, e nem sempre o indivíduo tem um senso crítico ou uma bagagem cultural para discernir o que é verdade, o que é mentira, o que é manipulado, o que é construtivo, o que é para diversão e entretenimento, etc.
A democratização da comunicação é de vital importância, pois é através dela que poderemos exercer nosso direito à comunicação. A comunicação é um direito humano que deve ser tratado do mesmo nível e grau de importância que os demais direitos humanos. Esse direito integra a liberdade de expressão, o direito à informação, ao acesso pleno e às condições de sua produção. Procura compreender a garantia de diversidade e pluralidade de meios e conteúdos, a garantia de acesso equitativo às tecnologias da informação e da comunicação, a socialização do conhecimento, a participação efetiva da sociedade na construção de políticas públicas. A liberdade de expressão é um direito humano fundamental do indivíduo e passa a fazer parte da reivindicação do direito coletivo de acesso à informação e aos canais de expressão, como forma de conquista de cidadania pelos movimentos sociais. Está ligado à construção de identidades e subjetividades.
Para que haja uma democratização da comunicação, não basta que se promova uma maior inclusão e uma maior acessibilidade dos cidadãos. Essa democratização da comunicação é essencial para a construção da cidadania. São fundamentais ações que procurem criar e fortalecer os movimentos de democratização dessa comunicação no Brasil. É preciso que esses movimentos se articulem para defender seus interesses e usar essa força e essa união para conseguir que o Estado atenda às necessidades da população. Mas mais importante que uma sociedade com acesso a uma comunicação mais democrática, é a necessidade de que se tenha uma leitura crítica da mídia, uma distinção do que é real ou ficção. Precisamos de movimentos que busquem promover uma visão crítica sobre as muitas informações que recebemos, novos conteúdos com qualidade que construam uma nova consciência para fortalecer a democracia. Pois ao entendermos o que está errado e ao procurarmos melhorar, podemos criar um modelo de comunicação em que as pessoas possam participar e tirar lições úteis e aplicáveis para seu dia a dia.

Artigo produzido para a cadeira de ética